O que está em causa é
político porque a forma como o homem assenta o seu poder naquele clube
está há muitos anos escrita na história, teorizada de alto a baixo,
diagnosticada, com provas dadas e milhões de mortos no caminho. Chama-se
fascismo. Não tem outro nome: fascismo. Porque não se trata apenas de
uma forma autoritária de exercer o poder. É uma forma autoritária de
exercer o poder que alcança usando as regras da democracia, operando
dentro dessas regras - e com o único propósito de as subverter, para não
dizer arrasar. Esse é o mecanismo do fascismo. E faz isso falando ao
coração de uma ralé violenta, multiplicando discursos de exploração da
inveja social dessa ralé, fazendo de tudo uma permanente luta de
classes. Dando a essa vasta massa, até agora inorgânica, a ilusão de que
são eles que mandam, penalizando a seu bel-prazer os que na organização
falham - ou seja, conferindo-lhes afinal um poder que acaba por ser
bastante orgânico, portanto instrumentalizável (em favor do chefe),
articulável, intimidatório. Um poder que, ainda por cima, tem outra
virtualidade (do ponto de vista do interesse do líder): afastar para as
periferias os que internamente se indignam mas que ao mesmo tempo pensam
que isso não merece o seu máximo empenhamento porque afinal isto "é só
futebol". Não, não é só futebol.
Ou
melhor: é futebol, mas como terreno propício para que outras coisas bem
mais vastas germinem, quiçá se transformem em votos, quiçá escolhendo
políticos e quiçá começando também a ameaçar directamente os outros
políticos concorrentes (ou do próprio partido que teimem em não ser
reverentes ao chefe).
É certo que à
credibilidade da organização de que falamos não ajuda o facto de o
debate estar polarizado entre um chefe alucinado e dois banqueiros que
quase só aparecerem nos jornais nas páginas de assuntos criminais. Mas
entre uns e outros haverá pessoas sérias, e são essas que devem avançar.
Percebam: é muito mais do que um clube que está em causa.
PS -
Morreu António Arnaut. Não foi só o pai do SNS em 1978--79. Foi alguém
que em 1973 ajudou muito Mário Soares a criar o PS e alguém que se
manteve desde o início bastante bem informado sobre as movimentações dos
militares que depois fariam Abril. E foi mais: um político como já há
poucos, que não só deixou obra como o fez não ficando no fim nem mais
rico nem mais pobre do que era antes da política. Tristes os tempos em
que começamos a achar que homens assim são de exceção. Não deviam ser".
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