UTOPIAS
Utopia, lugar
de parte nenhuma, é um mundo ideal fora do espaço e do tempo, sociedade
sonhada, que se ambiciona perfeita, irreal, que sempre surge como sintoma,
aspirando ser solução, de uma crise que se advinha e receia.
As utopias soviéticas nasceram da crise política que desabou na URSS,
após a morte de Estaline. No
verão/outono de 1965, logo a seguir ao histórico XX Congresso do PCUS, durante
o qual Khruchtchev denunciou os crimes de Estaline, o escritor Ivan Efremov
concebeu um romance que iria revolucionar a literatura de ficção
fantástico-científica soviética, o
célebre, A nebulosa de Andrómeda. A nebulosa de Andrómeda é uma utopia clássica do século 20,
situada no século 30, durante a Era do Grande Círculo. A cultura, a ciência e a
técnica alcançaram na Terra o mais alto nível. Uma única sociedade comunista,
une, fraternalmente, todos os povos terrestres. O grande objectivo da
humanidade é, agora, a vitória sobre o espaço e o tempo, a passagem ao
espaço-zero, a possibilidade de comunicação directa e imediata entre todas as
civilizações do Universo. Na Era do
Grande Círculo não há políticos profissionais, não há cargos de responsabilidade
ocupados pela mesma pessoa durante muitos anos, não há um governo, mas sim uma
governação colectiva de Conselhos, apoiados por Academias especializadas, que
decidem em comum, havendo ainda um Conselho de Sábios para resolver possíveis
diferendos. Descrevendo
uma futura sociedade comunista, perfeita, harmoniosa e avançada, com pessoas,
concepções, situações e técnicas fantásticas, tão longínqua e tão difícil de
conceber, Efremov faz, corajosamente, por contraste uma crítica social e
política à sociedade comunista soviética do seu tempo. Da
lista dos melhores escritores soviéticos de ficção científica da geração de 60
saída da crise que se abatera sobre a União, que tiveram como mestre
reconhecido Ivan Efremov e como marco exemplar A nebulosa de Andrómeda, figuram
os irmãos Arkadi e Boris Strugatski. O primeiro livro dos Strugatski publicado
em Portugal foi, Que difícil é ser Deus. Datado de 1964 é um dos seus
trabalhos mais divulgados e elogiados, pelo tema e pelo conteúdo. Ele contém
uma mensagem extremamente lúcida e corajosa: não ingerência. O
historiador-explorador temporal Anton e a sua equipa, em missão de observação
num planeta que vive a sua idade média, luta consigo próprio para não
interferir em acontecimentos, imprevisivelmente violentos e condenáveis, que
para além do mais, o afectam sentimentalmente. Ele pode fazê-lo, tendo atrás de
si todo o enorme poder da ciência e da técnica da Terra, ele é, ali, naquele planeta,
um deus. Mas pode um deus privar a humanidade da sua natural evolução, da sua
história? Substituir uma humanidade por outra humanidade?
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