10 de junho de 2011

A Dama do Lago

Nos primeiros dias do mês passado, digamos que em muito boa hora, surgiu no mercado, com chancela da Contraponto, uma nova edição do quarto romance de Raymond Chandler, com tradução escorreita e fiel de Carlo Magalhães. Voltei a lê-lo, talvez pela décima vez. Mas qual foi o livro de Chandler que não li pelo menos dez vezes? Recordo, a propósito, o que sobre ele então escrevi, no livro Chandler & Marlowe que editei há cerca de seis anos: "The Lady in the Lake foi primeiro um conto com esse mesmo nome, ao qual Chandler agregou agregou outros dois, Bay City Blues e No Crime in the Mountains. Foi publicado em Novembro de 1943, embora tenha começado a ser escrito em Abril de 1939, três meses depois do conto que lhe deu o título ter aparecido no magazine Black Mask. O segundo conto era já de 1937 e o terceiro só foi escrito em 1941. Foi, pois, um trabalho muito mastigado, cheio de abandonos e retomas , o que lhe retirou alguma frescura e espontaneidade. Um história algo sombria como sombrios eram os tempos que então se viviam. A guerra na Europa e no Pacífico preocupava Chandler, enormemente, que não esquecia a sua participação na guerra de 14-18, estado de espírito agravado pelo seu isolamento, longe de qualquer actividade social regular. Nesta nova investigação de Marlowe o confronto é, desta vez, com um polícia, Dergamo, tenente da polícia municipal de Bay City, homem brutal, corrupto e ciumento. E é o ciúme que o destrói. Ele mata a mulher que ama, Muriel, porque ela, responsável pelas desonestidades pelas quais ele envereda, o atraiçoa e se torna uma assassina. Quando o xerife Jim Patton pergunta a Marlowe quem matou Muriel, este responde que só pode ser "alguém que a tinha amado e odiado, alguém que era demasiado polícia para a deixar escapar com mais um homicídio, mas não tanto que fosse capaz de a entregar para que tudo viesse a saber-se. Alguém como Degarmo". Degarmo mancha a reputação da polícia, mas é suportado pelo espírito corporativo da mesma, e, por essa razão, chega ao extremo a que chega. Os tempos são de inquietação e incerteza, e assim, como desabafa um colega seu, "Que vão para o inferno. Dentro de duas semanas estarei no exército", como quem diz, para quê ralar-me se qualquer dia me mandam para a guerra. O xerife Jim Patton, chefe da polícia de Puma Point, região onde se desenrola boa parte da intriga, representa uma outra face da polícia. É rústico, vagaroso, bonacheirão, mas não lhe falta esperteza e é meticuloso. É grande não de gordura mas de robustez. Ele é a lei na sua circunscrição e executa-a com firmeza e honestidade. Gosta da profissão e procura exercê-la o melhor possível. O seu slogan para as eleições que se aproximam e visam o lugar que ocupa, retrata bem o seu perfil: "Atenção, eleitores! Votem no chefe Jim Patton. Ele está demasiado velho para ir trabalhar." Marlowe gostou logo dele. Deve-lhe ter adivinhado nos olhos a honestidade e o humor."

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