24 de fevereiro de 2021

MANOJAS: a divagar e recordar - 5

Quando saí da tropa, naturalmente, procurei emprego, visto que a situação económica dificilmente me permitiria, sem mais, voltar ao estudo, mesmo que estivesse disposto a isso. Ao saber que a CUF tinha começado a admitir pessoal jovem com pelo menos o curso liceal, resolvi candidatar-me. Fiz um estágio, de duas semanas, nas instalações fabris do Barreiro ao fim do qual fui admitido, provisoriamente, por seis meses, e, seguidamente, contratado. Por sorteio, calhou-me ser colocado nos escritórios da Zona Têxtil, tendo lá trabalhado durante um ano, pouco mais, antes de ser transferido para os correspondentes escritórios de Lisboa, conforme o estabelecido nas condições contratuais. Sinceramente, não exagero se disser que detestei aquele ano em que lá permaneci, não pelo trabalho em si, mas, principalmente, pelo ambiente opressivo, no escritório, e coscuvilheiro no refeitório. Só voltei ao Barreiro por imperativo de serviço, uma vez, e uma segunda por imperativo político, que explicarei.                                                                                                              Levantava-me todos os dias às seis da manhã, excepto aos domingos, claro, para apanhar o eléctrico 28 que saía dos Prazeres e me deixava na rua da Conceição, perto da praça do Comércio, que eu atravessava a correr para apanhar o barco que atravessava o Tejo e me levava ao cais do Barreiro, seguindo-se uma caminhada de cerca de meia hora, a passo estugado, para chegar às nove horas ao meu local de trabalho. Incrivelmente, os horários dos barcos não coincidiam com os horários das camionetas de carreira, e não por mais do que cinco ou dez minutos. Era normal chegar-se ao cais e vê-las a parir.                               O chefe dos escritórios da Zona Têxtil, o sr. Teixeira, funcionário antigo, respeitado e competente, era também dos chefes mais temidos e detestados. Nunca tive dele qualquer razão de queixa pessoal, mas eu tinha um estatuto diferente da maioria do pessoal que por lá havia, quase todo de origem operária, com pouca instrução, homens e mulheres que ele conhecia quase desde o berço, que tratava por tu, alguns que estavam lá por influência dele, a quem à mais pequena falta era capaz de castigar e insultar da maneira mais soez. Todos sentados às secretárias de costas para o chefe, nada de conversas, e ninguém a sair, no fim do dia de trabalho sem lhe pedir licença, o que nem sempre era concedida. E não havia pagamento de horas extraordinárias. Mas havia uns caderninhos onde eram anotados todos os erros e falhas cometidos por cada um, durante o ano, com o objectivo que se pode imaginar, como por exemplo, o subsídio de Natal concedido pela empresa, no valor máximo de um mês, ser dependente do critério das chefias que o podia reduzir ou mesmo cortar.  Um dos sabujos do sr. Teixeira, que também os havia, tinha a missão de ter em dia esses caderninhos e de andar sempre atento ao que se dizia e fazia. É certo que, pessoalmente, nunca tive qualquer problema com o sr. Teixeira, salvo ele ter atrasado, intencionalmente, a minha transferência para Lisboa. O que ele pretendia é que eu optasse por permanecer no Barreiro. Livra! Como já referi, voltei lá por imperativo político, estávamos então no período mais quente do pós 25 de abril. Foi a convocação de uma assembleia geral de trabalhadores do Barreiro com a finalidade de se votar a expulsão de três colegas, acusados de serem contra-revolucionários. A acusação vinha do operariado conotado com o MRPP. Avisadamente, a comissão de trabalhadores, de feição comunista, não alinhou na prepotência, mais a mais vindo ela de onde vinha. E eu e muitos outros colegas de Lisboa resolvemos ir à assembleia defender os colegas acusados cujo crime, ao fim e ao cabo, não era outro senão, imagine-se,  serem militantes do PS. Após a discussão, a votação fez-se à porta fechada e de braço no ar, mas acabou por nos ser favorável. Pelo que, apelidados com raiva de “os alpacas de Lisboa”, termos estado em risco de apanhar uma valente porrada. Não nos livrámos foi do susto.                                                               Trinta e dois anos passados, entretanto, com a CUF a chamar-se Quimigal, já então como quadro superior, chefe de serviço, fui levado a reformar-me, o que aconteceu em 1987. Política de reformas antecipadas para renovação de quadros? Não. Em poucos anos, a Quimigal não se reformou, definhou, desapareceu. Foi uma subida a pulso que até meio do percurso correu com normalidade, mas que a partir do glorioso 25 de abril de 1974, foi encontrando algumas barreiras que irremediavelmente a atrasaram. Barreiras resultantes de certas posições que tomei, de que não me arrependo, embora me tenham penalizado, e não pouco. Exemplifico: o ter colaborado com a Comissão de Trabalhadores quando esta tomou o controlo temporário da empresa, logo após o 25 o de abril. Por “sorte”, coube-me controlar o andar da administração (por exemplo, impedir a saída ou destruição de documentos), onde reinava o patrão Jorge de Mello, que , aliás, não me levantou qualquer problema, ao contrário do director financeiro e das secretárias da administração (nunca mais me falaram); o ter trocado o Sindicato dos Escritórios, da UGT, pelo Sindicato dos Químicos, da CGTP, que englobava a maioria dos trabalhadores, alinhando com o princípio de que o sindicalismo vertical dava mais força reivindicativa; o ter defendido, por três vezes, como testemunha principal, junto do tribunal arbitral, colegas que se queixavam, com razão, não estarem devidamente classificados. Houve outros motivos, talvez o facto, pelos vistos não esquecido, de durante o antigo regime, ter sido visitado na empresa por um agente da PIDE, calculo que só para me avisar e assustar. citando irrelevantes casos passados. Mas foram os acontecimentos atrás citados que me fizeram ouvir do director financeiro:” Você é um inimigo da empresa.”, e do director da Divisão a que eu pertencia e que veio a ser presidente do Conselho de Adminitração:“Só é pena ele ser comunista”. Ao primeiro virei-lhe as costas, ao segundo, no meu último dia na empresa, pedi uma audiência que foi aceita, para me despedir e dizer-lhe, e disse, que a minha militância política só a mim dizia respeito, fosse ela qual fosse, e que nunca tinha afectado ou interferido na minha actividade profissional. como se inferia da própria frase opinativa.                                                                                                                                                                                          E não foi tudo, mas por aqui me fico.

 




20 de fevereiro de 2021

Chandler & Marlowe: introdução


Eis uma (ilusória) segunda edição, revista, alterada e aumentada, de um pequeno livro por mim editado, em 2005, de homenagem ao escritor Raymond Chandler, e para assinalar e celebrar o facto, esquecido ou desconhecido por quase todos, de ter ocorrido nesse ano o centenário do nascimento do detective Philip Marlowe, protagonista de todos os seus romances.                                                                            Raymond Chandler escreveu e ficcionou, em fins de 1938, a primeira investigação de Philip Marlowe, a que deu o de The big sleep. Nela, logo de início, o detective, falando de si a pedido do seu cliente, o general Sternwood, revela, para além de outros dados pessoais, ter 33 anos. Daí o poder considerar-se, assim se entende, que teria nascido durante o ano de 1905.                                                                           “Mas é bom lembrar que Philip Marlowe não é uma pessoa real. Ele é uma pessoa imaginária”, desabafou Raymond Chandler, em carta de 19 de outubro de 1951, respondendo ao sr. Inglis, um  leitor  que tanto o questionava sobre o detective.                                                                                                   Não ignorando o esclarecimento, reconheçamos que o mesmo pode ter sido dito por despeito, não querendo o escritor ser ultrapassado, em importância e prestígio, por alguém que apenas devia ser reconhecido como uma criação sua, ou, não por isso, mas apenas por amizade e lealdade para com o parceiro cioso da sua privacidade.                                                                                          Naturalmente, é me mais agradável admitir a segunda hipótese do que a primeira, embora esta possa ser mais plausível. Não é de esquecer que em 1941, já depois de The big sleep e de Farewell, my lovely, e antes de High window, Raymond Chandler tentou fazer esquecer Philip Marlowe, ao entregar para publicação o conto, No crime in the Mountains, dando ao detective narrador o nome de John Evans, embora ele fosse Philip Marlowe em tudo o mais. Aliás, ainda na mesma carta em que nega a existência real de Marlowe, Chandler como que se contradiz ao declarar indignado, linhas à frente: “Repudio a sua sugestão que Philip Marlowe despreza a fraqueza física dos outros. Não sei onde foi buscar tal ideia, e tenho a certeza que não é verdadeira. Estou também um pouco farto das insinuações segundo as quais ele está sempre enfrascado em uísque. A única justificação que vejo para isso é quando lhe apetece uma bebida ele admite o desejo abertamente e não hesita em confirmá-lo.                                                          Seja como for, o que pretendo dizer é que nada me impede de aceitar que Philip Marlowe possa ter sido uma pessoa real, que tenha existido, e não apenas uma criatura imaginada e criada pelo escritor, querendo acreditar nessa possibilidade, sobre ele escrevi, nos dois capítulos que no livro lhe são dedicados, ressalvando que tudo o que revelo, embora suposto, é baseado, tem suporte, nos contos, romances, artigos e cartas do escritor





 

  

 

 

 


18 de fevereiro de 2021

MANOJAS: a divagar e recordar - 4

Eu já frequentava um curso superior, no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, quando fui convocado para fazer o serviço militar. Podia ter pedido um adiamento para tentar acabar o curso, mas devido à instabilidade e à falta de confiança que então sofria, os estudos não me estavam a correr nada bem, com a agravante de ter entrado em conflito com um dos assistentes. Lembro-me dele, não do seu nome, aliás não tendo a intenção de o nomear, mesmo que ele me viesse à cabeça. Uma antipatia à primeira vista que culminou com uma discussão acalorada e gesticulada que terminou com os óculos do sujeito no chão, partidos, sem que eu, estou certo, lhe tivesse tocado sequer com um dedo, o que teria sido bem mais grave. Fiquei marcado, como era de prever, mas longe de mim a ideia de responsabilizar esse acontecimento pelo meu fracasso. Não foi ele que determinou, em definitivo, que eu não viesse a ser um economista, um financeiro. A verdade verdadeira é que devia ter ido para letras e não para ciências, mas fui na conversa de que as ciências davam mais garantias, tinham mais saída, para mais e melhores empregos. Mas foi uma burrice. É uma burrice permitir que o cifrão condicione as nossas escolhas de vida. E lá fui para a tropa, nunca mais regressando ao Instituto. Mas houve outros motivos.                                                                                                                                                        Fiz a recruta num quartel do Lumiar, de Administração Militar, passei a aspirante a oficial e acabei por sair da tropa já como alferes, porque não quis, ou não pude, ir mais além. E bem me convinha. Presenciei algumas brutalidades, aturei algumas cavalidades, e passei por algumas situações algo complicadas, até perigosas, principalmente durante as duas manobras militares em que participei, no Campo Militaras de Santa Margarida. Três exemplos: o jeep em que me deslocava, uma vez ter-se avariado numa zona alvo de artilharia e outra vez ter-se incendiado, o comandante de uma unidade de artilharia, para onde fora destacado, sendo eu de Administração Militar, escalar-me como oficial responsável por uma bateria. Este último caso quase me custou um processo disciplinar devido aos meus veementes protestos. Eu era provisor, responsável por todo o abastecimento da unidade, desde o papel para limpar o cú até às munições , passando pelas rações alimentares para oficiais e soldados, tendo comigo, para isso. um sargento bebedolas (o vinho para as refeições nunca faltou) e meia dúzia de soldados. Um exagero, uma loucura, que não me dava um minuto de descanso, que quase não me dava tempo para dormir, e o idiota daquele coronel a pôr-me de oficial de dia a uma bateria de artilharia. Como recompensa fui o único oficial da unidade a não ser louvado, embora o 2º comandante, um major, me tivesse elogiado pelo trabalho realizado, dando-me a desculpa esfarrapada e estúpida de eu só não ter recebido um louvor devido a não pertencer à arma de artilharia, mas ser de um serviço. E disse-o sem se rir. Eu não era louvado pela arma por ser de um serviço, mas sendo de um serviço podia ser responsável pela arma. Que raio de arma! Que lindo serviço!                                          Sim, saí da tropa já como alferes, porque quis, mas, principalmente, porque não me garantiram que pudesse seguir a carreira militar. O meu avô já, entretanto, falecera, e a casa passara para o meu nome, com a renda actualizada. Estava na altura de deixar os verdes anos e passar à vida adulta.                        Já empregado e com a vida mais ou menos estabilizada fui de novo convocado para manobras. Fui, cumpri, e saí como tenente. Convidado para estágio de capitão, mais uma vez não me garantiram a permanência no exército. Adeus tropa, adeus para sempre!             


     






 

17 de fevereiro de 2021

Para a história da literatura policial portuguesa que um dia alguém há-de escrever: Introdução

A literatura policial assenta em histórias que, em princípio, obedecem ou devem obedecer a três exigências: ter crime, ter mistério, ter investigação. O crime pode ser de sangue ou não: homicídio, roubo, rapto, chantagem, mas deverá ser sempre, incondicionalmente, enigmático, ter enigma, ser misterioso, e, assim, obrigar sempre a uma investigação exigente, para ser desvendado - quem o cometeu, como, onde, quando, porquê - a cargo da polícia oficial, ou, na eventual ausência inicial desta, de um detective profissional privado, de um investigador amador, ou apenas um diletante.  A satisfação destas exigências que, independentemente do rigor e da imaginação e diversidade com que são tratadas, caracterizam o género, depende naturalmente do talento, da vontade e das intenções do escritor.                                                                                                                                                          Segundo consenso maisou menos alargado, a literatura policial nasceu em meados do século XIX, mais precisamente em 1841, com a publicação de um pequeno romance, The murders in the rue Morgue (1), protagonizado por um investigador diletante, o francês Auguste Dupin, imaginado pelo escritor norte-americano Edgar Allan Pôe, embora o seu desenvolvimento só se tenha verificado vinte anos mais tarde, graças ao escritor francês Émile Gaboriau, criador dos inspectores Tabaret e Lecoq, da Sûreté, e a sua verdadeira consolidação, maturidade e geral aceitação, a partir dos finais dos anos 80, ainda do século XIX, se deva ao britânico Conan Doyle, genial criador do mítico detective privado Sherlock Holmes e do seu amigo e biógrafo dr. Watson.                                                                                      Não esquecer, no entanto, que já antes do nascimento desta literatura policial, subordinada à investigação dedutiva do mistério e do crime, já existiam, e continuaram e continuam a existir, histórias sobre casos do foro policial, embora de contornos, características e objectivos diferentes, que, em certa medida, resultaram do facto dos escritores cedo se terem apercebido da atracção que a imaginação humana sente e continua a sentir, pelas grandes tragédias, pelos dramas de “faca e alguidar”, pelos intrincados confrontos entre a maldade e a moralidade, pelo macabro e o terror, com o sobrenatural à mistura, pelo que, com inteira propriedade, sempre e melhor a podemos considerar e adjectivar de moderna, de literatura policial moderna, e, já há muito, de clássica.                                                            Ainda hoje há quem considere a literatura policial um género literário de segunda ordem. É um preconceito de que insiste em esquecer que a qualidade de uma obra não depende só do tema abordado, mas do rigor, da substância, da originalidade e qualidade com que o mesmo é apresentado, desenvolvido, aprofundado, e até enquadrado no contexto social. Mas reconheça-se que já são poucos os que se esquivam e se envergonham de ser apanhados a ler, ou apenas a ter na mão, um romance policial e que quando o são se desdobram em justificações ridículas, pueris.                                         Já Siegfried Kracauer, no seu tratado filosófico, Der Detektive-Roman (2), composto entre 1922e 1925, escrevia: “O romance policial que a maior parte das pessoas cultas conhecem como obra extra-literária sem valor, levando uma existência confortável nas bibliotecas de empréstimo, conquistou progressivamente uma posição à qual dificilmente se pode contestar o seu grau e a sua importância”. Também Jorge Luís Borges, em 1978, numa sua conferência sobre o conto policial (3), interrogava: “Que poderíamos dizer como apologia do género policial?” e respondia: “Há uma muito evidente e acertada: a nossa literatura tende para o caótico. Tende-se para o verso livre porque é mais fácil que o verso regular, mas o contrário é que é verdade. Tende-se a suprimir personagens e argumentos; tudo é muito vago. Nesta nossa época tão caótica, algo existe que, com humildade, conservou as virtudes clássicas: o conto policial. Isto porque não se compreende um conto policial sem princípio, meio e fim. Têm-nos escrito escritores de segunda ordem, mas alguns saíram da pena de escritores excelentes, como Dickens, Stevenson e, sobretudo, Wilkie Collins. Eu diria, em defesa da novela policial, que ela não precisa que a defendam; lida presentemente com um certo desdém, vem salvando a ordem numa época de desordem. É uma coisa meritória e que lhe devemos agradecer.”                                               E Ernest Mandel, na introdução à sua história social do romance policial, Delighful Murder (4), de 1948, declarava: “Em primeiro lugar devo confessar que gosto de ler romances policiais. Durante muito tempo pensei que eram um simples divertimento, uma evasão: quando lemos um não pensamos em mais nada e, assim que acabamos de o ler, deixamos de pensar nele. Mas este livrinho é em si próprio a prova de que essa maneira de ver é pelo menos incompleta.”                                                            Assim como o nosso Fernando Pessoa, num texto (5) de reflexão pessoal, confessava: “Um dos poucos divertimentos intelectuais que ainda restam ao que ainda resta de intelectual na humanidade é a leitura do romance policial. Entre o número áureo e reduzido das horas felizes que a vida deixe que eu passe, conto por do melhor ano aqueles em que a leitura de Conan Doyle ou de Arthur Morrison me pega na consciência ao colo…”                     

          (1) - Edgar Allan Põe, Os crimes da rua Morgue, em Histórias de Mistério e Terror, Livraria Civilização, Porto, 1966

(2   (2) - Siegfried Kracauer, Le Roman Policier, un traité philosophique, Payot, Paris, 1981

(3   (3) - Jorge Luís Borges, Borges, oral, em Obras Completas, 4º volume, Círculo de Leitores, Lisboa, 1999

(4    (4) - Ernest Mandel, Cadáveres Esquisitos (uma história social do romance policial), Edições Cotovia, Lisboa, 1993

(5    (5) - Fernando Pessoa, Quaresma, decifrador, em Obras de Fernando Pessoa, Assírio & Alvim, Lisboa, 2008                     


15 de fevereiro de 2021

Teatro Esquecido: prólogo

Irreflectidamente, classifiquei-o de teatro de cordel Um acervo de cerca de cinco dezenas de folhetos quase todos datando da segunda metade do século XIX do espólio herdado do meu avo. Exemplares que pelo seu mau aspecto e precário estado de conservação, bem pareciam ter estado ao ar pendurados num cordel Guardados e esquecidos, não me recordava de alguma vez os ter visto, o que não aconteceria se eles tivessem sido, não enfiados numa gaveta da secretária, mas no armário envidraçado das cortinas verdes poiso dos seus livros, que eu, ainda infante, em segredo ilusório, receando a proibição que, aliás, nunca veio, cedo comecei a visitar. Livros, todos eles de autores portugueses, assim me fui, gradualmente, apercebendo. curiosamente mais de poesia que de teatro, mas onde predominava a prosa, e dela a de Camilo. Essa prosa que bem cedo me atraiu e ainda hoje me seduz. No entanto, as "joias da coroa", e era para elas que os meus olhos se sentiam atraídos, sempre que abria o armário, eram dois exemplares de Os Lusíadas, dois grossos e belos volumes, um mais alto mas menos bojudo, encadernados em couro e com muitos dourados, letras e desenhos. Dois livros magníficos, ambos editados pela Imprensa Nacional, o primeiro de 1869, com ensaio biográfico do visconde de Juromenha, e o segundo de 1931. prefaciado por Carolina Michaelis de Vasconcelos e revisto e anotado por José Maria Rodrigues. Na altura não lhes tocava, só mais tarde, mas sempre com a reverência e o prazer com que ainda agora os manuseio. 
Mas, voltando ao assunto, nos herdados folhetos teatrais. Encontrei-os, mas faltando-me a pachorra para os ler, sequer para um folhear minimamente atento, indiferente às autorias, tive, mesmo assim, um rebate de sentimental respeito, e, depois de os desempoeirar e limpar, arrumei-os em três caixas de cartão, encomendadas para o efeito, em cuja lombada mandei gravar os dizeres. Teatro de Cordel. 
Esqueci-os? Sim e não, pois, esquecê-los de todo, não o consegui. Não mo permitiu o cartaz que os acompanhava, ao qual não resisti, mandando-o emoldurar e expondo-o em lugar bem à vista Um cartaz que se apresentava com algum requinte gráfico, como sendo do Grupo Dramático César Marques, e que anunciava uma récita para o dia 20 de Março de 1898, um domingo. O programa era extenso. Abria com a declamação de uma poesia, "O Estudante Alsaciano", a que se seguiam três peças de um acto. Uma Experiência, O Canalha e Os Trinta Botões, e dois entreactos, a cançoneta Zás, Traz, Paz, e o monólogo, Os Três Soldados. Sobre os autores dos textos nada constava, embora eu viesse a saber que o da peça Os Trinta Botões se chamava Eduardo Garrido. Do elenco faziam parte os meus avós paternos, sendo o meu avó, porque não dize-lo, a estrela da companhia. Era ele que declamava a poesia e protagonizava as três peças, ou seja, começava por poetizar, depois compunha o marinheiro José Borrasca, da primeira peça, s seguir encarnava Carlos, o canalha, e terminava vestindo a pele de um brasileiro, o proprietário Baia A minha avó modestamente, era apenas a Rosa, a criada do tal Baia. Eram ambos muito novos, o meu avô tinha 19 anos e a minha avó 16, e estavam casadinhos de fresco. Cerca de oito anos depois desse dia tão especial, tiveram o seu terceiro filho, meu pai. 
Não me vou embrenhar em explicações justificativas quanto ao meu actual e inesperado interesse, tantos anos passados, por essas tão mal tratadas e esquecidas brochuras. Aconteceu! E muito cedo me apercebi como fora precipitado ao classificá-la como o fiz. Na verdade, era mais do que duvidoso que pudessem ser consideradas do teatro de cordel. Todas elas, pelo menos! Debruçando-me sobre o assunto, recorrendo como é devido, aos especialistas, aos estudiosos que sobre ele se têm pronunciado aprendi que o teatro de cordel não é um género dramático, é antes uma designação bibliográfica que se aplica a toda um acervo de peças teatrais, originais, imitadas ou traduzidas, sérias ou cómicas, românticas, históricas, religiosas...,  de grande aceitação popular pelo seu primarismo, que inundou o panorama teatral português no século XVIII e primeiras décadas do século XIX, cuja designação lhe advém da pobreza gráfica dos folhetos, impressos em fólio, e postos à venda na rua pendurados em barbantes pregados nas paredes e nas portas Ao invés, o teatro dos folhetos que herdei, revela, aqui e ali em muitas das pecas, mas não todas, traços de vulgaridade e de fraco nível literário, pertence quase todo ao segundo semestre do século XIX, apenas quatro ao primeiro decénio de século XX, o seu registo gráfico é razoável, e insere-se ou é influenciado pelos movimentos literários então em vigor, o romântico, o neo-romântico e o naturalista Além do mais, todas as peças tem o autor bem identificado, o que raramente acontece nas de cordel.
Chamei a este livro, teatro esquecido e não teatro ignorado, primeira opção pensada, dado que algumas das peças envolvidas, embora não todas, e respectivos autores, estão referenciados nos livros da especialidade e, também, porque, no seu tempo, todas elas, mesmo as de mais fraca qualidade, além de editadas, foram ou terão sido representadas.
São, então, quarenta e oito peças, vinte sete de um só acto, sendo oito de dois actos, quatro de três actos, e duas de cinco actos, além de sete entremezes, e, acompanhando o acervo, cinco almanaques e um catálogo. De todo este espólio apresento uma relação completa das peças, transcrevendo na integra os entremezes, e enxertos das restantes, relação que faço acompanhar de brevíssimas notas sobre os autores e um apanhado dos principais teatros então existentes.

MANOJAS: a divagar e recordar - 3

Alguém disse e/ou escreveu, não sei quem, mas alguém que sabia o que dizia ou escrevia, não sei quando ou onde, que alguém, homem ou mulher, para ser verdadeiramente alguém, devia plantar uma árvore, ter um filho, escrever um livro. Não será uma máxima bíblica, mas não haverá quem, homem ou mulher, não queira ser alguém, e não ambicione, não queira, não deseje, cumprir as três regras. Ouvi ou li a sentença, era então muito jovem, e, pretendendo ser alguém, logo me aprontei a cumpri-la. A árvore plantei na aldeia dos Vidais, aldeia que fica a cerca de 10 quilómetros das Caldas da Rainha, entre as Caldas e Rio Maior, aldeia onde passei muitos verões, aldeia onde nasceu e conheci a Helena, sem na altura me passar pela tonta que viria a aturá-la, e ela a mim, já lá vão 63 anos. Julgo que um pessegueiro, se é que não foi uma pereira ou uma macieira, que posso jurá-lo, medrou. Quanto ao filho, ainda tive que esperar alguns anos. Aliás, tive dois, um casal, e convencionalmente, só depois de estar casado, com a Helena claro está. O mais trabalhoso foi o livro, por muito que eu gostasse de escrever. . Gostaria de ter sido um escritor, um romancista que, em certa medida, vivesse da escrita, mas cedo percebi que não tinha unhas para o ser. Faltou-me o dom, o talento, a imaginação, a coragem, tudo isso e mais alguma coisa? Se lá! O que sei, no entanto, é que tal não evitou que tivesse escrito páginas e páginas, muitas resgadas, de histórias inacabadas, de ideias não concretizadas, mas nem todas perdidas, muitas engavetadas. Registo-as agora e aqui, as que completei e delas me agradei: Chandler & Marlowe (sobre o escritor Raymond Chandler e a sua criatura, o detective Philip Marlowe), edição do autor; Contos do (meu) entardecer (contos de perfil autobiográfico), edição do autor; Teatro esquecido (apresentação anotada de peças do século XIX, do espólio herdado do meu avô), não editado; O fantástico, a ficção científica & géneros afins na novelística portuguesa (cronologia e antologia), edição do autor; Escritos (1981-1989) e o que ficou por dizer (2013) (artigos sobre cinema e literatura), não editado; Literatura policial moderna (história do romance policial); Para a história da literatura policial portuguesa que um dia alguém há-de escrever (cronologia), não editado.


  


12 de fevereiro de 2021

MANOJAS: a divagar e recordar - 2

Não foi, Graças a Deus, que atingi e ultrapassei a barreira dos 90 anos, assim como não foi, Graças a Deus, que aos 6 anos já era órfão de pai e mãe. Sou cristão porque fui baptizado, mas, por convicção própria, não sou crente, nunca tendo sido pressionado pela família para o ser ou não. Respeito os que, convictamente, acreditam e têm fé no seu Deus, seja qual for a religião que professam: cristianismo, budismo, hinduísmo,islamismo, … PARAGRAFO. Quando eu era jovem, muito jovem, sei lá, talvez com os meus 11, 12 anos, sonhava muitas vezes com o ano 2000. Era para mim e, estou certo, para muita, muita gente, um ano mítico, um ano em que aconteceriam coisas extraordinárias, não o fim o mundo como alguns temiam, mas sim o início de uma era de grande desenvolvimento, de grandes descobertas, uma era de alegria e felicidade, e eu ansiava por lá chegar. Mas fazia contas e concluía, com desânimo, que só o atingiria se vivesse para lá da barreira dos setenta. E como lá conseguiria chegar, interrogava-me, se pertencia a uma família cujos membros, pais, avós, tios, pareciam destinados a morrer cedo. Ao fim e ao cabo não só alcancei o ano 2000 e o deixei para trás, como comprovei o que, aliás, já há muito sabia, ele era um ano igual aos outros e, bem vistas as coisas ou as contas, apesar dos muitos festejos em sua honra, nem era ele a virar o século. PARAGRAFO. Os camaradas e amigos, meus, da minha geração: da escola, do liceu, da faculdade, do bairro, dos cafés, dos bares, das casas das meninas, da jogatina, do futebol, do trabalho, já todos me abandonaram, mas, não sei porquê, sempre que penso neles, sinto-me traidor, não traído. Deixei-os ir, não os segurei, não fui com eles, fiquei-me por cá. Choro por eles, por todos eles. Cito os mais chegados, os mais íntimos: o Saraiva, o Simões, o Ferraz, o Palhinhas, o Cabral. Sempre nos tratámos pelos apelidos, raramente pelo primeiro nome, e, com uma excepção, por tu. Eu e o Cabral sempre nos tratámos por você, embora, curiosamente sem êxito, tivéssemos tentado o tu. Porquê? Tenho-me interrogado, e só encontro uma explicação: quando iniciámos a nossa amizade já não eramos uns rapazolas, ainda a crescer, a escolher, a formar, eramos homens feitos, casados, com filhos, as nossas mulheres tinham sido colegas liceais. Eramos de esquerda, tínhamos aspirações, opiniões, gostos, coincidentes. Era, foi sempre, uma amizade baseada na confiança, no respeito, na consideração, mútuos. Uma amizade pura, simples, adulta. PARAGRAFO. Escrever memórias não é, para o cidadão comum, uma prática muito habitual, mas quem embarca numa viagem ao passado, seja ou não personagem de relevo, normalmente só o faz, salvo casos de oportunismo mediático, quando se sente a viver a última fase da sua vida. É o que acontece comigo, que, disposto a divagar sobre algumas das recordações que contribuíram para a minha maneira de ser e de estar, de pensar, por pouco ou nenhum interesse que tenham para outros, que não para mim ou, julgo, para os meus, e tendo ultrapassado folgadamente a idade média de esperança de vida, sinto ser a altura de arrancar com elas. PARAGRAFO. Alguns dos dias mais giros da minha vida, passei-os, em casa do Ferraz, com a minha Helena e a Helena dele. Giros é o termo apropriado. Eu tinha comprado uma máquina de filmar de 8 mm e ele estava numa de fotógrafo semi-profissional. Propus-lhe fazer um pequeno filme, o que ele aceitou entusiasmado. Seria uma co-realização com argumento meu e fotografia dele. A história era simples, quatro tipos que se reuniam em casa de um deles, para batê-las, ou seja, para uma noitada de poker, a doer. Os quatro eram, um branco, um preto, um amarelo (um chinês), e um vermelho (um índio)., identificados através de máscaras de carnaval. O branco, uma máscara com um sorrisinho bem sacana, era o hospedeiro, e era ele, inevitavelmente, ou não fosse branco, que depenava os outros três. O estúdio foi a casa de jantar do Ferraz que a esvaziou, distribuindo os móveis pelas outras divisões. E durante dias e dias, à noite, reuníamo-nos para preparar cada cena, cada movimento, cada tomada de vista, para nos mascararmos e para filmar. Fervilhavam as ideias e as opiniões, nem sempre coincidentes e daí as discussões, por vezes acaloradas, e por fim as gargalhadas, a começar por elas, as Helenas. Inevitavelmente, a função terminava quase sempre a horas tardias, com bocejos, com lamentos já a pensar no próximo levantar da cama, mas nunca sem antes bebermos uma chávena de cacau, comermos umas bolachas e voltarmos rir das peripécias acontecidas. E fizemos o filme, deliciamo-nos a vê-lo, mostrámo-lo a familiares e amigos, deixámo-lo a andar de mão em mão, e perdemo-lo. Nunca onseguimos descobrir quem ficou com ele. Ficou-nos a recordação daquelas noitadas que, para mim e para a Helena e, estou certo, para o Mário Ferraz e para a Helena dele, foram das mais divertidas, ou melhor dito, das mais giras das nossas vidas. E por aqui me fico. Pl’o que havia de me lembrar. PARAGRAGO. Que alívio, a Helena desta vez achou o meu escrito bem escrito, até se riu. Recordações!

8 de fevereiro de 2021

MANOJAS, a divagar e recordar

Detesto máscaras, detesto esconder-me, detesto escondidas. Sabem ao que me refiro. Faz sentido? Mas tenho de as usar, devo usá-las, uso-as, embora não tenha boas orelhas para elas, sobrecarregadas com as hastes dos óculos, já para esquecer os incómodos aparelhecos auditivos. Sim, oiço mal. Paciência. Detesto máscaras. Mas se assim é …! Alto e para o baile, não, o Manojas não é uma máscara. Eu sou ele, ele sou eu. O Manojas é o balbuciar infantil do meu nome: Manuel José. Era pelo menos assim que os meus priminhos me chamavam, e já todos me tratavam. Que saudades dessa infância feliz, mas que foi tão breve, mesmo muito breve. Adiante! O Manojas, sim, sou eu. Dele, de nós dois, são: o que penso, falo, digo, escrevo, oiço, leio. Embora: certo é que, ler?, já leio pouco, muito pouco, e, cada vez mais, só os livros que já li, os meus, tantos, credo. Diariamente só o jornal, o Público, e semanalmente, o Expresso, e ambos com algum desagrado e muitas reservas. A calúnia, a mentira, a deturpação, o partidarismo politiqueiro, campeiam na comunicação social; certo é que, ouvir?, e bem, até é desagradável quando, ao abrir a televisão na hora dos noticiários, e surge o presumido Rodrigues dos Santos, (ele é o pior), excitado e gritante, a massacrar-nos, assustar-nos, entristecer-nos, com as desgraças da epidemia. Acabo sempre por saltar para o Mezzo; certo é que, escrever?, já só o que o Manojas vem para aqui desabafar; certo é que, dizer? falar?, que dizemos e falamos, nós, a Helena e eu, confinados uma eternidade, evitando queixas, lamentos, tristezas, senão das trivialidades do dia a dia? certo é que, pensar?, claro que penso, muito, cada vez mais a fugir para o divagar, e cada vez mais, divagando, a fugir para o passado, para o meu, para o dos meus, irresistivelmente. Não juro, mas que eu saiba, que eu desse por isso, tive sete primos, dois do lado materno, ou melhor, duas: a Nita e a Lisete, e cinco do lado paterno: o Luís, o Carlos José, e três Marias, a Isabel, a do Carmo e a Teresa. A Nita e a Lisete eram meio brasileiras, pela mãe, e meio ingleses pelo pai. A minha tia Ilda, filha do primeiro casamento da minha avó Anália com um brasileiro, era casada com um rapaz de origem inglesa, o tio Gastão, que era telegrafista num navio português de passageiros. O tio Gastão que durante a guerra, foi suspeito de comunicar com os alemães, o que levou os ingleses a abordarem o navio e a levá-lo para Inglaterra. Mas nada se provou, não foi fuzilado e no fim da guerra voltou para o seio da família, para Portugal. Muito antes desse triste episódio, a prima Lisete e eu, muito chegados, com 3, 4 anos, andávamos sempre abraçados. Ela era a minha preferida, eu era o preferido dela. Ficámos por aí. A Isabel era a mais velha de nós. Não terá tido uma vida muito feliz, com uma mente fechada e obsessiva, uma paixão falhada. Foi, contrafeita por razões familiares, minha testemunha de casamento. Não teve coragem de recusar o convite, compareceu à hora no registo, fez o seu testemunho e desandou. Ficámos tristemente desavindos. O primo Luís, irmão da Isabel, um doidivanas que se tornou um vigaristazinho (desculpa lá ó primo), um dia, numa manhã ensolarada, estávamos de férias em Setúbal, em casa dos tios Calé, fomos a Troia, e à chegada, atirou-me borda fóra do barco onde íamos, para me tirar o medo do mar e obrigar-me a nadar (justificações dele). E lá fui a gritar e a esbracejar até ter pé. A praia estava perto e não me afoguei. Maluquices. O primo Carlos José, que tinha apenas menos alguns meses de idade, era o meu grande companheiro de brincadeiras. Devorávamos o Salgari e eramos, ora eu, ora ele, o Sandokan ou o Corsário Negro. Teria 14, 15 anos quando partiu com o pai, a madrasta, e as duas irmãs, a Maria do Carmo e a Maria Teresa, para África, para a “nossa” Angola. O tio Calé tinha para lá umas empresas, julgo que de conservas de peixe, a precisar de melhor gestão. Durante algum tempo fomo-nos correspondendo e ele foi-me contando o seu excitante princípio de crescimento e desenvolvimento. Ó, que jovens, obedientes, apetecíveis e disponíveis pretinhas por lá haveria, para o jovem português. Mas o silêncio veio cedo e definitivo. Foi o último da família a regressar, muitos anos depois. Já não era o mesmo, era outro. Ignorou-nos a todos, sem excepção. Isolou-se. Jamais o voltei a ver. Um mistério. Das irmãs, das minhas primas, pouco tenho a recordar. A Teresa, a mais nova de nós, é, assim o creio e desejo, além de mim, a única que ainda está viva. Telefonei-lhe no Natal, estava bem. E basta, por aqui me fico. E sim, têm toda a razão, p’ró que me havia de dar. Já escreveste melhor, disse-me a Helena com intenção, sem dó nem piedade. A idade não perdoa, pensei. Que novidade dei a mim próprio!