18 de fevereiro de 2021

MANOJAS: a divagar e recordar - 4

Eu já frequentava um curso superior, no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, quando fui convocado para fazer o serviço militar. Podia ter pedido um adiamento para tentar acabar o curso, mas devido à instabilidade e à falta de confiança que então sofria, os estudos não me estavam a correr nada bem, com a agravante de ter entrado em conflito com um dos assistentes. Lembro-me dele, não do seu nome, aliás não tendo a intenção de o nomear, mesmo que ele me viesse à cabeça. Uma antipatia à primeira vista que culminou com uma discussão acalorada e gesticulada que terminou com os óculos do sujeito no chão, partidos, sem que eu, estou certo, lhe tivesse tocado sequer com um dedo, o que teria sido bem mais grave. Fiquei marcado, como era de prever, mas longe de mim a ideia de responsabilizar esse acontecimento pelo meu fracasso. Não foi ele que determinou, em definitivo, que eu não viesse a ser um economista, um financeiro. A verdade verdadeira é que devia ter ido para letras e não para ciências, mas fui na conversa de que as ciências davam mais garantias, tinham mais saída, para mais e melhores empregos. Mas foi uma burrice. É uma burrice permitir que o cifrão condicione as nossas escolhas de vida. E lá fui para a tropa, nunca mais regressando ao Instituto. Mas houve outros motivos.                                                                                                                                                        Fiz a recruta num quartel do Lumiar, de Administração Militar, passei a aspirante a oficial e acabei por sair da tropa já como alferes, porque não quis, ou não pude, ir mais além. E bem me convinha. Presenciei algumas brutalidades, aturei algumas cavalidades, e passei por algumas situações algo complicadas, até perigosas, principalmente durante as duas manobras militares em que participei, no Campo Militaras de Santa Margarida. Três exemplos: o jeep em que me deslocava, uma vez ter-se avariado numa zona alvo de artilharia e outra vez ter-se incendiado, o comandante de uma unidade de artilharia, para onde fora destacado, sendo eu de Administração Militar, escalar-me como oficial responsável por uma bateria. Este último caso quase me custou um processo disciplinar devido aos meus veementes protestos. Eu era provisor, responsável por todo o abastecimento da unidade, desde o papel para limpar o cú até às munições , passando pelas rações alimentares para oficiais e soldados, tendo comigo, para isso. um sargento bebedolas (o vinho para as refeições nunca faltou) e meia dúzia de soldados. Um exagero, uma loucura, que não me dava um minuto de descanso, que quase não me dava tempo para dormir, e o idiota daquele coronel a pôr-me de oficial de dia a uma bateria de artilharia. Como recompensa fui o único oficial da unidade a não ser louvado, embora o 2º comandante, um major, me tivesse elogiado pelo trabalho realizado, dando-me a desculpa esfarrapada e estúpida de eu só não ter recebido um louvor devido a não pertencer à arma de artilharia, mas ser de um serviço. E disse-o sem se rir. Eu não era louvado pela arma por ser de um serviço, mas sendo de um serviço podia ser responsável pela arma. Que raio de arma! Que lindo serviço!                                          Sim, saí da tropa já como alferes, porque quis, mas, principalmente, porque não me garantiram que pudesse seguir a carreira militar. O meu avô já, entretanto, falecera, e a casa passara para o meu nome, com a renda actualizada. Estava na altura de deixar os verdes anos e passar à vida adulta.                        Já empregado e com a vida mais ou menos estabilizada fui de novo convocado para manobras. Fui, cumpri, e saí como tenente. Convidado para estágio de capitão, mais uma vez não me garantiram a permanência no exército. Adeus tropa, adeus para sempre!             


     






 

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